Jogo parado? "E agora, quem poderá me socorrer?"
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Jogo parado? "E agora, quem poderá me socorrer?"
Ontem, conversava eu com uma pessoa querida jogadora neste RPG, que acabou me confessando que andava desanimada porque "o jogo está parado".
E eu fiquei pensando nisso, embora o tanto que eu pense muito resume-se a poucos segundos, já que a rapidez do meu raciocínio é diretamente proporcional à imensidão do meu ego, do qual muito me orgulho.
Fiquei pensando comigo, eu quase não tenho conseguido dar conta do tanto de posts, o que é bom sinal, pois que seja a média neste RPG dois ou três posts por dia, como o pessoal daqui posta bem, textos elaborados, contendo um leque amplo de informações (vários jogadores pesquisam história, geografia, dados científicos ou artísticos para escrever seus posts) e envolvendo caracterizações muita vez complexas do personagem, às vezes fica difícil acompanhar, para quem quer estar por dentro de tudo, das tramas de cada personagem.
O jogo tem andado com vários focos de ação em ambientes diferentes, mas eu sei que não posso culpar quem acha que o jogo está parado.
Não posso culpar. Os RPG's por aí, quase que sem exceções, por proibirem demais, imporem muitas restrições totalmente desnecessárias e arbitrárias, como por exemplo, restrições de gosto (por incrível que pareça é isso mesmo, o administrador não gosta de determinado estilo e barra o cara que usa esse estilo), acabam ensejando a formação de uma mentalidade reativa nos players. O jogador não arrisca dar um pum fora do penico. Começa a ficar cheio de dedos, não dá um passo sem combinar - e o jogo combinado, já ficou bem explicado lá em "'Jogo' combinado e proatividade do player" que "jogo" desta espécie pode ser qualquer coisa, menos RPG.
Graças à decadência generalizada dos RPG's de fórum, geralmente administrados por pessoas que nunca jogaram um RPG de mesa e acham que RPG é blog ou palco para estrelismos pessoais, os jogadores aprendem a destrutiva lição da paciência passiva, de ficar esperando o ar da graça de outro personagem, ou as determinações de uma Moderação intransigente e lenta, que se move a passos paquidérmicos, desinteressada no jogo e nos interesses dos players, que vê apenas o que ela quer e o tipo de jogo que ela sabe jogar, refugando o que desconhece. Um exemplo muito claro disso, dessa incapacidade, desse bitolamento, é que os RPG's porteira afora não aceitam personagens loucos. Pode tentar. Se for para ser louco, que seja um "louco" dentro do contexto... um "louco" ajustado... um "louco" que os Moderadores possam controlar, possam prever... um "louco" que bajule os gostos deles... um "louco" igual a qualquer outro, porque, oras, ser original não é ser diferente, é ser igual - e daí por diante... ou melhor, e daí para trás, num discurso retrógrado, forçado, carregado de despeito, de preconceito, recendendo à incapacidade de lidar com o que é diferente, e principalmente com o que é irreverente — os impotentes e nanicos intelectuais têm, por motivos óbvios (sempre óbvios), muito medo da irreverência.
Podemos dar graças a Deus que em um Módulo como Vampire existem os Malkavianos, Clã que deve servir de incentivo para quem quer fazer loucuras autênticas, não os meros arrotinhos fora de ocasião do "louco" ajustado, que se é igual aos outros só o pode ser porque foi enfiado numa camisa-de-força e trancafiado no quartinho acolchoado dos que só sabem atuar na zona de segurança, que por isso acabam vendo como ameaça o pensamento único, subversivamente próprio e exclusivo dele.
Y que vengan los toros! Moderação confiante, que sabe o que fazer, não se incomoda com nada. Principalmente quando a Moderação é unida, sabe o que quer e inclui neste querer o querer individual de cada jogador.
Por isso, jogo parado só existe para quem não se mexe.
Por que mesmo?
Se você vê que sua trama não está fluindo, analise o jogo como um todo. Perceba onde estão os focos de ação mais intensos, veja se é isso que deseja para você e vá até lá. Seu personagem não pode? está preso, atado por circunstâncias alheias a ele? Pense em saídas, transforme esse plano em posts, faça loucuras, ninguém vai reprimir ninguém aqui, porque nós sabemos o porre que é lidar com uma administração pequena, repressora, que não admite nada que não seja igual à sua imagem e semelhança sem sal, de tramas e narrações de novela mexicana, que só joga na zona de segurança e se sente desconfortável quando determinado personagem faz uma coisa muito diferente que deixa os outros sem reação, por não lhes ocorrer uma idéia tanto ou mais arrojada do que fazer diante do "absurdo" que têm diante de si.
A maior contribuição do escritor e filósofo francês Albert Camus foi mostrar que a verdade está no absurdo, e o mesmo fizeram Nietzsche, a Psicanálise, a Patafísica - o glorioso Surrealismo. Quem quer se devotar ao lugar-comum, que não impeça quem quer ser mais que um modelo de bom cidadão...
Desde que haja verossimilhança no jogo, é válido. Não vai ser um administrador quem irá chegar no player e dizer "mas essa visão do seu personagem" ou "essa forma de pensar do seu personagem não é verossímil". Ora, meu Deus, no terreno mental, principalmente, tudo é possível. E é no terreno mental do jogador que surgem as estratégias: quanto mais ele se sentir à vontade para pensar livremente, tanto mais conseguirá divisar saídas e caminhos para fazer seu personagem chegar onde ele quer.
Se você sabe que o seu jogo não será condenado; se você sabe que, por mais que players possam discordar das teses uns dos outros, aqui nenhuma discordância em off vai interferir no on; se você sabe que sempre terá um feedback e nenhum personagem será rechaçado ou ignorado porque pensa e age diferente — se nem mesmo isso vai acontecer aqui; se você vê que uma determinada trama sua não decola, mova-se para outro foco de ação. Não deu no que você queria lá? Mova-se para outro foco de ação. Não deu de novo? Mova-se para outro foco de ação. Só existe jogo parado, especialmente num RPG em que, bem ou mal, sempre há feedback, para quem não se mexe.
O feedback não estava do jeito que você queria? Tente de novo. Parta para outra. Busque interação com outro. Seu parceiro de jogo não dá no coro? Tem pelo menos mais uns 30 personagens ativos no fórum. Eu não vi nenhum post ficar sem resposta até agora por mais de 3 dias (e nosso prazo de tolerância segundo as regras é uma semana). Se você está ansioso porque 3 dias é muito, ótimo sinal. Sinal de que o jogo não está parado, senão você já tinha se resignado.
No fim, a pessoa que me confidenciou que estava desanimada, me disse que agora não está mais, porque ocorreu uma interação que a empolgou bastante. Pensar que o player que interagiu com ela até confabulou comigo "e eu preocupado que poderia atrapalhar a trama deles". Minha opinião maligna foi "Atrapalhe". Tem que atrapalhar mesmo. Até game de console, se você for parar para pensar por que o pessoal vicia naquilo, é muito louco pensar nisso, pois o que seu personagem enfrenta frame by frame é obstáculo, obstáculo, obstáculo, obstáculo, obstáculo, obstáculo. E por que as pessoas gostam tanto? Porque vêem que insistindo elas conseguem vencer. Sentem-se capazes de superação.
E seja lá a estratégia que você bolar para superar o "problema", o Moderador não vai gorar seu jogo porque não deu no que ele queria. Afinal, ninguém joga aqui por auto-afirmação. Já vi acontecer em um RPG, para variar do rançoso Módulo escola, da administração meter todo mundo dentro de um quarto e querer que os jogadores se sujeitassem a ficar ali para participar de uma putaria, e certo grupo de players que estavam no jogo para pensar em tramas mais ousadas do que ficar rebolando num bundalelê sem graça toda vida, bolou uma forma de escapar. Grosso modo, explodiram uma parede e saíram. Mas a administração ficou contrariadíssima. Inventou que a explosão deu num banheirinho e ninguém escapou coisa nenhuma (= jogada deus ex machina dessa administração, que nós não reconhecemos como válida para este RPG, o TDS). Por fim, acabou deletando os posts dos jogadores dissidentes, sem aviso, autoritariamente, para variar, porque os administradores e Moderação por aí parece que pensam que o RPG é deles. Que os jogadores estão lá para servi-los. Que a vontade deles deve acontecer a todo custo, nem que seja para ficar enxotando jogador, carcando deus ex machina a torto e a direito e deletando posts sem qualquer concessão prévia de uma oportunidade para defesa.
Em última análise, nós temos apenas 3 regras aqui: o deus ex machina não é reconhecido, nem o overpowerismo e o uso de personagens alheios. Sobre esses itens e como exatamente eles funcionam, nós já discorremos nos tópicos anteriores de Avisos e Dicas. De resto, pode tudo. Não há estilo proibido, não há forma de pensar ou de ver proibida, não há personalidade proibida, o personagem pode ser esquizofrênico, pode ser um débil mental megalomaníaco, pode ser um mentiroso deslavado, pode distorcer todos os fatos e tudo que vê (feito o Cardeal), pode falar por enigmas (se for Malkaviano, deve), pode ser xarope, pode ser o cara mais previsível e simplório do mundo, pode ser agressivo, pode ser irreverente, pode ser insuportável, pode ser um doce de coco, pode ser totalmente incoerente, pode ser tarado, pode ser preconceituoso - se até na vida real se vê de tudo, por que não poderia acontecer num RPG cujo tema é, ainda por cima, fantástico? "O artista jamais é mórbido. Tudo pode exprimir." (Oscar Wilde)
RPG de verdade não é lugar para inibição. Seja um jogador proativo.
Eu gostaria de encerrar com uma carta do meu Mestre e Senhor, o que me Abraçou quando eu tinha apenas 16 anos de idade, o pai do Surrealismo, Magister André Breton, a Tristan Tzara, um romeno muito louco que era amigo dele e com quem ele acabou se desentendendo - no fim da vida, Breton lhe escreveu essa carta, que eu acho que fecha com chave de ouro a conclusão do parágrafo anterior. Se não fecha, abre mais — o que fecha ainda melhor.
Faz dois meses que estou morando em Place Blanche. O inverno aqui está ameno, as mulheres fazem aparições curtas e deliciosas às mesas em frente ao café onde me sento para beber alguma coisa. As noites existem apenas nas hiperbóreas terras da lenda. Não consigo lembrar de ter vivido em outro lugar senão aqui. Aqueles que afirmam me conhecer estão enganados. Apesar que agora dizem que me julgavam morto.
Você está certo de invocar meu nome.
Afinal de contas, quem está falando? André Breton, um homem de grande coragem, um homem que até agora esteve mais ou menos satisfeito com seus atos de rebelião e subversão, tudo porque um dia ele descobriu que estava permanentemente impedido de fazer o que quer. E é verdade que eu tenho um sentimento de haver causado mal a mim mesmo em várias ocasiões; é verdade que apesar de todas as minhas aventuras e lutas, descubro que, diante do que eu quis, fui menos que um monge, menos que um gondoleiro. Mas ainda tenho um sentimento de que vou me encontrar novamente, e que neste começo de inverno tão primaveril, no meio da alegre e adorável Montmartre, estou pensando pela primeira vez no que irei fazer da MINHA vida.
Até então você e eu estivemos pensando no Universo, em termos de seus opostos, na união destes em uma única categoria, esta mesma conciliável com o primeiro termo e assim por diante, até a mente alcançar a idéia absoluta, a reconciliação de todos as oposições e a unidade de todas as categorias: a verdadeira igualdade onde não existe “do meu jeito”, “do seu jeito”, onde todos os jeitos são igualmente aceitos porque todas as pessoas são fortes o suficiente para não se sentirem ameaçadas pelas diferenças do outro.
Se o Dadaísmo houvesse buscado isso realmente, eu não teria lançado críticas a você, muito embora ainda preferiria estudar a vida agitada da primeira mulherzinha que me aparecesse do que dormir ao som dos lauréis de Hegel.
O Dadaísmo ainda está longe dessa espécie de considerações. A prova das suas mentiras está no fato de que hoje, quando toma grande prazer em ser tido na conta de um círculo vicioso — “Um dia ou outro, vamos verificar que antes de Dadá, depois de Dadá, sem Dadá, na direção de Dadá, apesar de Dadá, contra Dadá, será sempre Dadá” —, sem notar que isso priva o movimento de toda sua virtude e significado, é causa de perplexidade descobrir que os apoiadores do seu movimento são pobres tolos que vivem em um mundo arcaico, lustrando vermes e apavorando com a memória de más ações, em verdade, ultrapassadas.
O perigo se mudou para outro lugar faz tempo, e o senhor, Sami, não se mudou com ele. Por que lhe importa tanto compartilhar glórias com homens como Marinetti e Baju?!
Dizem que eu mudo de amigos da mesma forma que as pessoas mudam suas botas, mas eu não posso continuar usando os mesmos sapatos para sempre, e quando já não me servem mais, eu os dou para meus criados.
Aprecio e admiro Francis Picabia, e não me aborreceria se algumas de suas críticas contra mim, que me soaram tão elogiosas, fossem repetidas mais vezes. Fizeram tudo que podiam para distorcer perante ele minhas idéias e sentimentos, vendo claramente os que se colocaram entre nós que se pudéssemos nos entender ficaria comprometida a posição estabelecida daqueles que já montaram seu acampamento no sistema. O Dadaísmo, como qualquer outra dessas coisas, tornou-se justamente uma forma de construir um chão debaixo dos pés.
Algo que não tive a oportunidade de lhe dizer antes é que não pode existir uma idéia absoluta simplesmente porque fomos submetidos a uma espécie de mimetismo mental que nos impede de continuar aprofundando-nos nas coisas e nos faz olhar hostilmente qualquer conceito, imagem ou pessoa que nos cative com grande poder.
Dar sua vida por uma idéia, pelo Dadaísmo, pela idéia de si mesmo, só poderia ser obtido a custo de sacrifícios intelectuais. Idéias não são boas nem más, elas apenas são: e todas têm o poder de levantar paixões de uma espécie ou de outra na minha mente.
Você me perdoará se eu mantiver que, ao contrário da hera, morro se me aferro por muito tempo a uma pessoa. Ou gostaria que me preocupasse se estas palavras ofendem aquele culto da amizade que, de acordo M. Binet-Valmer, é a base da sociedade?
Eu sei que você não dá a menor importância para Binet-Valmer e suas piegagens, e portanto repito o que deveria lhe ter dito antes:
O Dadaísmo não será eficaz enquanto você for incapaz do desapego:
Abandone o Dadaísmo.
Abandone sua esposa, sua amante.
Abandone suas esperanças e seus medos.
Abandone suas crianças na floresta.
Abandone a substância, troque-a pela sombra.
Abandone sua vida fácil,
Abandone sua escravidão ao cultivo de um futuro confortável para suas idéias.
Abandone tudo. E vá.
Carta a Tristan Tzara, de 1º de abril de 1961.
E eu fiquei pensando nisso, embora o tanto que eu pense muito resume-se a poucos segundos, já que a rapidez do meu raciocínio é diretamente proporcional à imensidão do meu ego, do qual muito me orgulho.
Fiquei pensando comigo, eu quase não tenho conseguido dar conta do tanto de posts, o que é bom sinal, pois que seja a média neste RPG dois ou três posts por dia, como o pessoal daqui posta bem, textos elaborados, contendo um leque amplo de informações (vários jogadores pesquisam história, geografia, dados científicos ou artísticos para escrever seus posts) e envolvendo caracterizações muita vez complexas do personagem, às vezes fica difícil acompanhar, para quem quer estar por dentro de tudo, das tramas de cada personagem.
O jogo tem andado com vários focos de ação em ambientes diferentes, mas eu sei que não posso culpar quem acha que o jogo está parado.
Não posso culpar. Os RPG's por aí, quase que sem exceções, por proibirem demais, imporem muitas restrições totalmente desnecessárias e arbitrárias, como por exemplo, restrições de gosto (por incrível que pareça é isso mesmo, o administrador não gosta de determinado estilo e barra o cara que usa esse estilo), acabam ensejando a formação de uma mentalidade reativa nos players. O jogador não arrisca dar um pum fora do penico. Começa a ficar cheio de dedos, não dá um passo sem combinar - e o jogo combinado, já ficou bem explicado lá em "'Jogo' combinado e proatividade do player" que "jogo" desta espécie pode ser qualquer coisa, menos RPG.
Graças à decadência generalizada dos RPG's de fórum, geralmente administrados por pessoas que nunca jogaram um RPG de mesa e acham que RPG é blog ou palco para estrelismos pessoais, os jogadores aprendem a destrutiva lição da paciência passiva, de ficar esperando o ar da graça de outro personagem, ou as determinações de uma Moderação intransigente e lenta, que se move a passos paquidérmicos, desinteressada no jogo e nos interesses dos players, que vê apenas o que ela quer e o tipo de jogo que ela sabe jogar, refugando o que desconhece. Um exemplo muito claro disso, dessa incapacidade, desse bitolamento, é que os RPG's porteira afora não aceitam personagens loucos. Pode tentar. Se for para ser louco, que seja um "louco" dentro do contexto... um "louco" ajustado... um "louco" que os Moderadores possam controlar, possam prever... um "louco" que bajule os gostos deles... um "louco" igual a qualquer outro, porque, oras, ser original não é ser diferente, é ser igual - e daí por diante... ou melhor, e daí para trás, num discurso retrógrado, forçado, carregado de despeito, de preconceito, recendendo à incapacidade de lidar com o que é diferente, e principalmente com o que é irreverente — os impotentes e nanicos intelectuais têm, por motivos óbvios (sempre óbvios), muito medo da irreverência.
Podemos dar graças a Deus que em um Módulo como Vampire existem os Malkavianos, Clã que deve servir de incentivo para quem quer fazer loucuras autênticas, não os meros arrotinhos fora de ocasião do "louco" ajustado, que se é igual aos outros só o pode ser porque foi enfiado numa camisa-de-força e trancafiado no quartinho acolchoado dos que só sabem atuar na zona de segurança, que por isso acabam vendo como ameaça o pensamento único, subversivamente próprio e exclusivo dele.
Y que vengan los toros! Moderação confiante, que sabe o que fazer, não se incomoda com nada. Principalmente quando a Moderação é unida, sabe o que quer e inclui neste querer o querer individual de cada jogador.
Por isso, jogo parado só existe para quem não se mexe.
Por que mesmo?
Se você vê que sua trama não está fluindo, analise o jogo como um todo. Perceba onde estão os focos de ação mais intensos, veja se é isso que deseja para você e vá até lá. Seu personagem não pode? está preso, atado por circunstâncias alheias a ele? Pense em saídas, transforme esse plano em posts, faça loucuras, ninguém vai reprimir ninguém aqui, porque nós sabemos o porre que é lidar com uma administração pequena, repressora, que não admite nada que não seja igual à sua imagem e semelhança sem sal, de tramas e narrações de novela mexicana, que só joga na zona de segurança e se sente desconfortável quando determinado personagem faz uma coisa muito diferente que deixa os outros sem reação, por não lhes ocorrer uma idéia tanto ou mais arrojada do que fazer diante do "absurdo" que têm diante de si.
A maior contribuição do escritor e filósofo francês Albert Camus foi mostrar que a verdade está no absurdo, e o mesmo fizeram Nietzsche, a Psicanálise, a Patafísica - o glorioso Surrealismo. Quem quer se devotar ao lugar-comum, que não impeça quem quer ser mais que um modelo de bom cidadão...
Desde que haja verossimilhança no jogo, é válido. Não vai ser um administrador quem irá chegar no player e dizer "mas essa visão do seu personagem" ou "essa forma de pensar do seu personagem não é verossímil". Ora, meu Deus, no terreno mental, principalmente, tudo é possível. E é no terreno mental do jogador que surgem as estratégias: quanto mais ele se sentir à vontade para pensar livremente, tanto mais conseguirá divisar saídas e caminhos para fazer seu personagem chegar onde ele quer.
Se você sabe que o seu jogo não será condenado; se você sabe que, por mais que players possam discordar das teses uns dos outros, aqui nenhuma discordância em off vai interferir no on; se você sabe que sempre terá um feedback e nenhum personagem será rechaçado ou ignorado porque pensa e age diferente — se nem mesmo isso vai acontecer aqui; se você vê que uma determinada trama sua não decola, mova-se para outro foco de ação. Não deu no que você queria lá? Mova-se para outro foco de ação. Não deu de novo? Mova-se para outro foco de ação. Só existe jogo parado, especialmente num RPG em que, bem ou mal, sempre há feedback, para quem não se mexe.
O feedback não estava do jeito que você queria? Tente de novo. Parta para outra. Busque interação com outro. Seu parceiro de jogo não dá no coro? Tem pelo menos mais uns 30 personagens ativos no fórum. Eu não vi nenhum post ficar sem resposta até agora por mais de 3 dias (e nosso prazo de tolerância segundo as regras é uma semana). Se você está ansioso porque 3 dias é muito, ótimo sinal. Sinal de que o jogo não está parado, senão você já tinha se resignado.
No fim, a pessoa que me confidenciou que estava desanimada, me disse que agora não está mais, porque ocorreu uma interação que a empolgou bastante. Pensar que o player que interagiu com ela até confabulou comigo "e eu preocupado que poderia atrapalhar a trama deles". Minha opinião maligna foi "Atrapalhe". Tem que atrapalhar mesmo. Até game de console, se você for parar para pensar por que o pessoal vicia naquilo, é muito louco pensar nisso, pois o que seu personagem enfrenta frame by frame é obstáculo, obstáculo, obstáculo, obstáculo, obstáculo, obstáculo. E por que as pessoas gostam tanto? Porque vêem que insistindo elas conseguem vencer. Sentem-se capazes de superação.
E seja lá a estratégia que você bolar para superar o "problema", o Moderador não vai gorar seu jogo porque não deu no que ele queria. Afinal, ninguém joga aqui por auto-afirmação. Já vi acontecer em um RPG, para variar do rançoso Módulo escola, da administração meter todo mundo dentro de um quarto e querer que os jogadores se sujeitassem a ficar ali para participar de uma putaria, e certo grupo de players que estavam no jogo para pensar em tramas mais ousadas do que ficar rebolando num bundalelê sem graça toda vida, bolou uma forma de escapar. Grosso modo, explodiram uma parede e saíram. Mas a administração ficou contrariadíssima. Inventou que a explosão deu num banheirinho e ninguém escapou coisa nenhuma (= jogada deus ex machina dessa administração, que nós não reconhecemos como válida para este RPG, o TDS). Por fim, acabou deletando os posts dos jogadores dissidentes, sem aviso, autoritariamente, para variar, porque os administradores e Moderação por aí parece que pensam que o RPG é deles. Que os jogadores estão lá para servi-los. Que a vontade deles deve acontecer a todo custo, nem que seja para ficar enxotando jogador, carcando deus ex machina a torto e a direito e deletando posts sem qualquer concessão prévia de uma oportunidade para defesa.
Em última análise, nós temos apenas 3 regras aqui: o deus ex machina não é reconhecido, nem o overpowerismo e o uso de personagens alheios. Sobre esses itens e como exatamente eles funcionam, nós já discorremos nos tópicos anteriores de Avisos e Dicas. De resto, pode tudo. Não há estilo proibido, não há forma de pensar ou de ver proibida, não há personalidade proibida, o personagem pode ser esquizofrênico, pode ser um débil mental megalomaníaco, pode ser um mentiroso deslavado, pode distorcer todos os fatos e tudo que vê (feito o Cardeal), pode falar por enigmas (se for Malkaviano, deve), pode ser xarope, pode ser o cara mais previsível e simplório do mundo, pode ser agressivo, pode ser irreverente, pode ser insuportável, pode ser um doce de coco, pode ser totalmente incoerente, pode ser tarado, pode ser preconceituoso - se até na vida real se vê de tudo, por que não poderia acontecer num RPG cujo tema é, ainda por cima, fantástico? "O artista jamais é mórbido. Tudo pode exprimir." (Oscar Wilde)
RPG de verdade não é lugar para inibição. Seja um jogador proativo.
Eu gostaria de encerrar com uma carta do meu Mestre e Senhor, o que me Abraçou quando eu tinha apenas 16 anos de idade, o pai do Surrealismo, Magister André Breton, a Tristan Tzara, um romeno muito louco que era amigo dele e com quem ele acabou se desentendendo - no fim da vida, Breton lhe escreveu essa carta, que eu acho que fecha com chave de ouro a conclusão do parágrafo anterior. Se não fecha, abre mais — o que fecha ainda melhor.
Faz dois meses que estou morando em Place Blanche. O inverno aqui está ameno, as mulheres fazem aparições curtas e deliciosas às mesas em frente ao café onde me sento para beber alguma coisa. As noites existem apenas nas hiperbóreas terras da lenda. Não consigo lembrar de ter vivido em outro lugar senão aqui. Aqueles que afirmam me conhecer estão enganados. Apesar que agora dizem que me julgavam morto.
Você está certo de invocar meu nome.
Afinal de contas, quem está falando? André Breton, um homem de grande coragem, um homem que até agora esteve mais ou menos satisfeito com seus atos de rebelião e subversão, tudo porque um dia ele descobriu que estava permanentemente impedido de fazer o que quer. E é verdade que eu tenho um sentimento de haver causado mal a mim mesmo em várias ocasiões; é verdade que apesar de todas as minhas aventuras e lutas, descubro que, diante do que eu quis, fui menos que um monge, menos que um gondoleiro. Mas ainda tenho um sentimento de que vou me encontrar novamente, e que neste começo de inverno tão primaveril, no meio da alegre e adorável Montmartre, estou pensando pela primeira vez no que irei fazer da MINHA vida.
Até então você e eu estivemos pensando no Universo, em termos de seus opostos, na união destes em uma única categoria, esta mesma conciliável com o primeiro termo e assim por diante, até a mente alcançar a idéia absoluta, a reconciliação de todos as oposições e a unidade de todas as categorias: a verdadeira igualdade onde não existe “do meu jeito”, “do seu jeito”, onde todos os jeitos são igualmente aceitos porque todas as pessoas são fortes o suficiente para não se sentirem ameaçadas pelas diferenças do outro.
Se o Dadaísmo houvesse buscado isso realmente, eu não teria lançado críticas a você, muito embora ainda preferiria estudar a vida agitada da primeira mulherzinha que me aparecesse do que dormir ao som dos lauréis de Hegel.
O Dadaísmo ainda está longe dessa espécie de considerações. A prova das suas mentiras está no fato de que hoje, quando toma grande prazer em ser tido na conta de um círculo vicioso — “Um dia ou outro, vamos verificar que antes de Dadá, depois de Dadá, sem Dadá, na direção de Dadá, apesar de Dadá, contra Dadá, será sempre Dadá” —, sem notar que isso priva o movimento de toda sua virtude e significado, é causa de perplexidade descobrir que os apoiadores do seu movimento são pobres tolos que vivem em um mundo arcaico, lustrando vermes e apavorando com a memória de más ações, em verdade, ultrapassadas.
O perigo se mudou para outro lugar faz tempo, e o senhor, Sami, não se mudou com ele. Por que lhe importa tanto compartilhar glórias com homens como Marinetti e Baju?!
Dizem que eu mudo de amigos da mesma forma que as pessoas mudam suas botas, mas eu não posso continuar usando os mesmos sapatos para sempre, e quando já não me servem mais, eu os dou para meus criados.
Aprecio e admiro Francis Picabia, e não me aborreceria se algumas de suas críticas contra mim, que me soaram tão elogiosas, fossem repetidas mais vezes. Fizeram tudo que podiam para distorcer perante ele minhas idéias e sentimentos, vendo claramente os que se colocaram entre nós que se pudéssemos nos entender ficaria comprometida a posição estabelecida daqueles que já montaram seu acampamento no sistema. O Dadaísmo, como qualquer outra dessas coisas, tornou-se justamente uma forma de construir um chão debaixo dos pés.
Algo que não tive a oportunidade de lhe dizer antes é que não pode existir uma idéia absoluta simplesmente porque fomos submetidos a uma espécie de mimetismo mental que nos impede de continuar aprofundando-nos nas coisas e nos faz olhar hostilmente qualquer conceito, imagem ou pessoa que nos cative com grande poder.
Dar sua vida por uma idéia, pelo Dadaísmo, pela idéia de si mesmo, só poderia ser obtido a custo de sacrifícios intelectuais. Idéias não são boas nem más, elas apenas são: e todas têm o poder de levantar paixões de uma espécie ou de outra na minha mente.
Você me perdoará se eu mantiver que, ao contrário da hera, morro se me aferro por muito tempo a uma pessoa. Ou gostaria que me preocupasse se estas palavras ofendem aquele culto da amizade que, de acordo M. Binet-Valmer, é a base da sociedade?
Eu sei que você não dá a menor importância para Binet-Valmer e suas piegagens, e portanto repito o que deveria lhe ter dito antes:
O Dadaísmo não será eficaz enquanto você for incapaz do desapego:
Abandone o Dadaísmo.
Abandone sua esposa, sua amante.
Abandone suas esperanças e seus medos.
Abandone suas crianças na floresta.
Abandone a substância, troque-a pela sombra.
Abandone sua vida fácil,
Abandone sua escravidão ao cultivo de um futuro confortável para suas idéias.
Abandone tudo. E vá.
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